Audifax Rios. 25 de Abril de 2016, Um Ano de Saudades


Audifax Rios em seu perfil no Facebook

Quis o destino que, na manhã daquele sábado, eu estivesse no bar do meu amigo Waldir, quando morava no bairro Álvaro Weyne, nome que vincula ao ex-prefeito de Fortaleza. Sem largar o cigarro, o proprietário indicou-me uma mesa próxima à tomada elétrica para que eu pudesse conectar o cabo do meu smartphone. Seguindo-se de uma “bruta” gelada.

 Liguei-me na página on line do jornal O Povo, quando li a notícia do falecimento do seu cronista, Audifax Rios. Primeiro espanto: o escritor e artista plástico só tinha 69 anos e gozava de satisfatória saúde. Segundo: Waldir era seu amigo de infância, desde as brincadeiras à beira do Rio das Garças (Acaraú), na Sant’Anna deles. E por fim, eu havia lido a sua coluna há poucas horas.
Rios, em Mundo Cordel

 O que escreveu naquela última vez foi algo que apenas Deus justificaria. Estava em sua Santana do Acaraú, sentindo o cheiro daquelas águas, vindas da nação tabajara, passando pela tremembé, descendo de tão distante para regozijar seu povo, que vem do português e da tribo areriú, na defesa do camocim: “A oração é uma mistura de reflexão sobre a história e relembranças dos tempos de eu menino. Ali, onde o rio lambe a ponta do Serrote da Rola, foi onde os índios Camocim deixaram de perseguir Frei Cristóvão de Lisboa e seu séquito, deixando em paz o missionário e intatas as imagens de Cristo e Senhora Santana, postas num nicho natural de pedras cobertas de orações de agradecimentos pela vida poupada e a promessa de construir uma capela sob invocação da avó do Homem. Isso lá por mil seiscentos e lá vai cacetada, compromisso pago um século depois”. Mais adiante ele lamenta a perda do amigo Raimundo, o canoeiro, “que teve um infarto fulminante, desaparecendo na correnteza do rio cheio, o corpo encontrado entre garranchos muito depois, longe, numa Sexta-Feira Santa”. Nosso homenageado escreveu sobre o filho da sua amiga Divindade numa sexta-feira, para partir, após um dia, igualmente infartado, na sua terra, a qual visitava.
Jornal O Povo, 20/11/1996

 Comuniquei ao Waldir, que me olhou sem entender. Houvera chegado de Santana naquela semana, onde fora pedir a benção ao pai adoentado, e nem ouviu falar que Audifax estava tão próximo, despedindo-se. Naquela hora, porém, mais um amigo no céu, vagando-se como o canoeiro, fazendo-lhe entristecer.
 O artista, que chegara na capital cearense em 1962, apaixonou-se pela pintura, colocando-a em letras, nas mensagens das agências onde trabalhou, e nas noites boêmias que frequentou.
 Eis a lembrança de um ano de saudades, na certeza que, enfim, um dia será a nossa vez, bravamos solenemente, com nobreza, nos morrotes que cercam seu povoado, ou na beira daquele rio que o cativou, quiçá no mirante da nossa Fortaleza, vendo os mares que assistem nossa luta pela história do bravo cearense que por seu povo a vida dedicou.

 Ao lado, o artista lançava "Iracema", naquela praia dos meus amores, tendo como convidado Zairton, dono de famosa mercearia na Praia de Iracema: "O livro é um canto de amor, mas também depoimento e documento, sobretudo um protesto contra a especulação imobiliária" (O Povo, no Dia Nacional da Consciência Negra, 20/11/1996).

Em 1973, o artista inaugurou a sua Asa Branca, na Av. Monsenhor
Tabosa em meio à música cearense. Foto Correio do Ceará


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