Oswald Barroso - Teatro Cearense em Livro - O Povo, 21/11/1986. Por Concy Bezerra

Compromisso com a Arte Popular
Um artista comprometido com o seu tempo, engajado nas lutas populares, entendendo a arte como prova de criação coletiva, é como classifica a diretora teatral e professora do Curso de Comunicação Social, Erotilde Honório, sobre o escritor e jornalista Oswald Barroso. Hoje (21/11/1986) será lançado, no Teatro da Emcetur, o livro intitulado “Irmandade da Santa Cruz do Deserto”, de Oswald Barroso, contendo a versão final da peça “O Pão” e o texto ópera “Moacir das Sete Mortes”, numa extensa programação pelos 50 anos do Caldeirão.
Com capa de Audifax Rios, o livro será apresentado em meio a recital e dramatização da peça (do autor e da colega Erotilde Honório, uma edição da Secretaria de Cultura e Desporto e Imprensa Oficial).
Nas três peças destacadas no livro, a professora o observa que Oswald segue o caminho mais consciente dos autores nordestinos: a linha popular. “Os temas são diferentes, mas a linguagem é a mesma, com clara influência “brechtiana”. Podemos recorrer a qualquer talento internacional sem desrespeitar a produção teatral de Oswald Barroso”, diz ela.
MOMENTO DE HUMANIDADE
A teatróloga vai mais além, reconhecendo no autor o desejo de aproximação com o brasileiro Augusto Boal, que é, a seu ver, suplantado pela influência de Brecht, especialmente pelo tratamento do texto e em relação ao compromisso com as lendas e as parábolas existentes nas tradições dos povos. “Não podemos dizer que por fazer um teatro de caráter político, de análise de comportamento ético do homem, Oswald Barroso, na sua estética, não apresente uma assimilação pessoal do marxismo-leninismo. Achamos que a filosofia lhe serve de base, encaixando no conceito de arte emprestado por Marx, quando a considera como “um momento de humanidade”.
E esse apelo estético, centrado no homem, na sua relação com o mundo, o autor, na opinião da professora, tanto quanto Brecht, não fecha nada como dogmático, o é, aliás, defesa do cientista. “A inquietação de estar sempre escrevendo, testando, experimentando, fazendo denotar o cuidado com o sempre mais próximo do ideal, dimensiona sua obra no sentido mais profundo das emoções humanas. O caráter de divertimento, de recreação, de prazer, está embutido no tratamento das manifestações populares estudadas e apresentadas”.
TRÊS OBJETIVOS
Para Oswald, no entanto, todo o seu trabalho persegue três objetivos: contribuir para criar uma dramaturgia popular nordestina, não apenas através de textos, mas também de uma prática teatral de encenação; poder revelar esse homem nordestino universal, que habita essa região do Globo, nas proximidades do ano 2000. “Meu personagem principal é o povo, tento mostrar a complexidade da formação desse povo, seus dilemas, conflitos e perplexidades. Me criticam porque meus personagens não têm vida interior muito grande, mas o que procuro é tratar dos conflitos do homem social, na sociedade, mostrando nuances, implicações e influências, misturadas de maneira mais rica e dialética. E mostrar esse conflito social, reflexo dos conflitos individuais, em que os personagens vivem reflexo social no seu interior, é justamente o meu terceiro objetivo”.
Reconhecendo-se em pleno aprendizado, Oswald questiona as próprias limitações do movimento teatral no Ceará, que levaram a algumas deficiências na sua formação teatral. “Isso me leva, no entanto, a procurar crescer coletivamente, em debates e discussões”. E trabalhar coletivamente tem sido a prática do autor.
Escrito de 1983 a 1985, “O Pão” é na opinião do escritor o mais teatral dos textos, permitindo-lhe incluir algumas indicações de cenas. Publicado na Revista Comédia Cearense, discute as relações de poder na sociedade, criticando a economia capitalista. Joga com três situações simultâneas, procurando ver os fatos sob os ângulos mais diversos, o que permite um trabalho de texto muito exigente, cada ator fazendo diversos personagens simultaneamente.
RESGATE DOS FATOS
“Irmandade da Santa Cruz do Deserto”, por outro lado, foi feita a partir de pesquisa realizada por Rosemberg Cariry, Firmino Holanda e o próprio Oswald. Importante e substanciosa, a peça procura fazer um resgate dos fatos que marcaram, o movimento do Caldeirão no ponto de vista popular. Questiona os caminhos tomadas pela comunidade e os que poderiam ter tomado, uma luta entre o povo, o clero e os latifundiários, colocando-se como uma peça histórica, com a preocupação maior de denunciar os fatos.
Oswald Barroso em 1986. Defesa da linha popular no teatro
Já o texto da ópera “Moacir das Sete Mortes”, feito em parceria com Eugênio Leandro, é tido pela crítica como o melhor texto teatral do autor, embora ele dê preferência a “O Pão”. Segundo Barroso, a pretensão foi fazer uma ópera cearense baseada na linguagem musical do Ceará, patrimônio do povo, com humor e ironia. “Procuramos revelar o outro lado da história, o não oficial, do ponto de vista popular, destacando os verdadeiros heróis cearenses, o povo anônimo. “Moacir”, o personagem central, é o João Grilo, o Amarelinho, o Cancão de Fogo, o Pedro Malazarte. É o nordestino arguto e sagaz, com mil estratégias para viver e continuar a acreditar em si mesmo. É o anti-herói com caráter”.

Texto de Concy Bezerra, Jornal O Povo, 21 de novembro de 1986.

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