Trairi - 26/01/1500 - Pinzón desbanca Cabral - História a ser Contada


 Certa noite, nos primeiros dias deste ano, ouvi, na emissora de rádio CBN de São Paulo, uma entrevista com Jorge Caldeira, escritor de cunho histórico, que resumiu, ao final dela, a sua avaliação sobre seus estudos: “A história do Brasil está para ser contada”.

 Ainda que pareça uma opinião exagerada, e humilhante para quem colabora com ela, leva-nos à certeza de que seu conceito, da história brasileira, é amplo, merecendo estudos constantes, uma vez que começou a ser escrita conforme interesses da metrópole, dos colonizadores. Objeto desta crônica, procuramos nos distanciar da leitura clássica, penetrando nas avaliações constantes nos livros independentes, aqueles raros de se encontrar nas livrarias, mas de cuidados extremos nas bibliotecas.

 Quando Pedro Álvares Cabral chegou ao Brasil, em 22 de abril de 1500, segundo fontes oficiais no sul da Bahia, os espanhóis não apenas já nos haviam avistado como pisado em terras brasileiras, no Nordeste, e no nosso entendimento, no Ceará.

Mapa sobre o Tratado de Tordesilhas
 Em 1494, o papa Alexandre VI reverenciou um acordo para pôr fim à disputa referente às conquistas marítimas entre Espanha e Portugal, com o Tratado de Tordesilhas, segundo o qual haveria uma linha imaginária a 370 léguas de Cabo Verde como referência, onde seu território leste pertenceria a Portugal.

 Na época de Cabral, partiram três expedições de Palos, Espanha, uma sob comando de Alonso Hojeda, auxiliado por dois dinâmicos cartógrafos: Américo Vespúcio (italiano) e Juan de la Cosa (autor dos primeiros mapas da costa brasileira, ainda que imprecisos); a outra à frente Vicente Pinzón, e a de Diogo de Lepe (Pinzón, seus dois irmãos, e Cosa participaram da famosa esquadra do genovês Cristóvão Colombo, em 1492, rumo à América do Norte, segundo Caldeira sabedores de aonde estavam indo, que não para as Índias). Embora os reis de Castela proibissem que aportassem, não os impedia de se abastecerem, notadamente com madeiras. Assim, é fato e lógico que praticamente todos desceram em “terras estrangeiras”.

 Segundo vários historiadores, como Mártir e Mõnoz, assim como os grandes cearenses (Pompeu Sobrinho e Raimundo Girão, por exemplo), no dia 26 de janeiro de 1500 Pinzón desembarcou no Ceará, aguardando até o dia 2 de fevereiro para denominar o local de Santa Maria de la Consolación, dia da purificação de Nossa Senhora. Seguindo na direção ESE, a 3,3 graus ao sul do Equador, conforme orientação da Espanha, os espanhóis iram encontrar o litoral poente cearense, evitando as correntezas do norte, entre as fozes do rio Pará (Curu) e Mundaú, contrariando vaga presunção de um mapa confuso de la Cosa, indicando Cabo Corso (Icapuí), quase na divisa com o Rio Grande do Norte e a do paulista Adolfo Varnhagen de que seria o Mucuripe.

Vicente Pinzón, por Condoy de Julho

 Em suma, isso nos objeta dizer que o atual município cearense de Trairi teria sido o primeiro local a ser pisado pelos europeus, quiçá os vizinhos Paraipaba ou Paracuru, ambos de extensão litorânea desprezível frente ao outro. Dois dias após, estava no Mucuripe (morro de Fortaleza), onde o almirante fincou uma cruz, a quem deu o nome de Rostro Hermoso, no dia de Santa Verônica, cuja face seria das mais lindas. Diogo de Lepe foi testemunha desse humilde monumento aproximadamente um mês depois.

 Por essa rota seguiu, também, Américo Vespúcio, florentino (italiano) que, embora a serviço de Portugal, trabalhou para Espanha na época de Vicente Pinzón. Registrou, no dia 17 de agosto de 1501, ter avistado um cabo, que não poderia ser outro senão Mundaú, conforme o historiador Tristão de Alencar.

Foz do rio Mundaú, Trairi CE

  As caravelas não conseguiriam, em pleno início do Século XVI, chegar ao Recôncavo Baiano sem abastecimento renovável, num litoral quente. Não havia tratado que impedisse a sobrevivência humana. Uma história ainda a ser mais do que contada.

 Fontes:
 Prothohistória Cearense - Thomaz Pompeu Sobrinho
 Pequena História do Ceará - Raimundo Girão
 História da Província do Ceará – Tristão de Alencar Araripe.



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