Accioly x Rabello. A Derrota do Povo
Dezembro de 1911. Em frente ao Quartel o povo pede a queda da oligarquia. (O Malho) |
Diante da luta contra a.monarquia, destacou-se, no Ceará, o
chefe do Partido Liberal e fundador do conceituado jornal O Cearense, senador
Thomaz Pompeu de Souza Brasil. Doente, indicou como seus sucessores seu filho homônimo
e seu genro, Antônio Pinto Nogueira Accioly, os quais lideraram o partido em
choque com o senador Paula Pessoa, fazendeiro e representante do polo
sobralense. A proclamação da República, em 1888, contudo, privilegiou os
republicanos históricos, fortalecendo os liberais e isolando os latifundiários,
freando as oligarquias rurais. Em consequência, como veremos adiante, houve um
racha no grupo dominante, dividindo-se entre simpatizantes de Deodoro da
Fonseca (“maloqueiros”) e de Floriano Peixoto (“cafinfins”).
Início da República
Nogueira Accioly |
Floriano Peixoto
A gestão de Floriano
Peixoto (1892 - 1896) foi centralizada nos polos dominantes, São Paulo, Rio de
Janeiro e Minas Gerais, indicando dirigentes nos estados e se fortalecendo, em
termos de bases de apoio, através da distribuição de cargos e isolamento de
opositores. Essa política, já conhecida, foi bem recebida pelos simpatizantes
do velho coronelismo. Mas a partir de então, as lideranças locais tinham a
orientação do chefe nacional do primeiro golpismo republicano, senador Pinheiro
Machado, e daí a subserviência ao governo central. Tal adesismo contribuiu para
o monopólio econômico, que enricou os capitalistas, favorecidos com empréstimos
bancários, associados ao governo estadual, já que possuíam o privilégio dos
negócios no exterior, como facilidades na importação de uma riqueza do momento:
materiais para a estrada de ferro.
Rodolfo Teófilo encara o Comendador
Nogueira Accioly tinha
os coronéis nas mãos e a eles ordenava medidas opressoras aos cidadãos
carentes, vitimas das secas, proibindo-as de imigrarem e negando ajuda aos
flagelados. Ou seja, os cearenses não tinham apoio estadual para aliviar a fome
nem lhes eram permitidas partidas para outros Estados. As pestes que abalaram o
solo cearense durante a seca de 1877 - 1879 estavam de volta, e, diante do descaso
de Accioly, o Dr. Rodolfo Teófilo comprou uma briga para fabricar vacinas
contra a varíola. E venceu. Tal embate fez a “oligarquia” perder deputados, de
modo que a administração de Nogueira Accioly (1896 - 1900) acabou por ver o então
“indesejável” Pedro Borges como seu sucessor. Mas na verdade uma vitória do
chefe político ao assistir a aprovação das suas contas, pelo governo posterior,
diante da maioria parlamentar oligárquica, em troca de uma senatoria.
Salvações no Papel
A Política das
Salvações imposta pelo governo do marechal Hermes da Fonseca (1910 - 1914)
trouxe um alento aos opositores do coronelismo de então. Tratava-se de uma
reação de parte de setores do Exército aos desmandos no País, procurando isolar
as oligarquias com a ascensão de um militar rebelde. O arquiteto do “toma lá dá
cá”, senador Pinheiro Machado, ainda governista como um certo partido hoje em
dia, já não era o interlocutor dos
coronéis, mas, no Ceará, o Comendador Accioly continuava impondo a sua força,
direcionando o seu PRC (Partido Republicano Conservador), presidido pelo
deputado Thomaz Cavalcanti, junto às autoridades nacionais. O Ceará se
posicionava contra as medidas do governo federal.
Primeiras Mobilizações
Concentração pró-Rabello na Praça dos Mártires em 1912. (O Malho) |
A esperança a nível federal desencadeou uma reação de setores da sociedade fortalezense. Pequenos comerciantes, profissionais liberais, estudantes, funcionários públicos iniciaram uma série de manifestações contra a continuidade da oligarquia. Um desses eventos ocorreu no dia 21 de janeiro de 1912, a Passeata das Crianças e Mulheres, organizada pela Liga Feminina Pró Ceará, aglomerando, entre a rua General Sampaio e a Praça do Ferreira, cerca de três mil pessoas. Enquanto o povo delirava, soltando rosas, tudo se desenrolava pacificamente quando, ao discurso de um menino de dez anos na praça, a cavalaria irrompeu contra os manifestantes, atirando e resultando em correria, feridos, com uma criança e um comerciante mortos.
Odele de P. Pessoa |
Os pais e demais cidadãos indignados se armaram com rifles a fim de enfrentar a polícia, que se abrigava no Palácio da Luz. Mas a cidade acabou ficando às escuras, afugentando uma rebelião maior, o que não impediu, no dia posterior, tiroteios defronte a Delegacia Fiscal e Cadeia Pública. Aproveitadores do momento de tensão saquearam e incendiaram a residência e a fábrica de tecidos, Progresso, de Nogueira Accioly; as residências de seus parentes José, Benjamin e Thomaz Accioly; as residências do ex-prefeito de Fortaleza, Guilherme Rocha, e do futuro, Cassimiro Montenegro; a residência de Gracindo Cardoso e a sede do antigo DNOCS, o IOCS (Palacete Carvalho Motta). O comendador assinou a renúncia e partiu, no vapor Pará, para o Rio de Janeiro, de onde continuou coordenando seus correligionários.
Franco Rabello no Governo
Franco Rabello |
A Armação
Palacete Accioly incendiado. Rua 24 de Maio com Guilherme Rocha. ( O Malho) |
Pinheiro Machado, na esperança de suceder Hermes da Fonseca, atraiu os “marretas”, todo o grupo de Accioly e o coronelismo de Floro Bartolomeu, médico baiano e parlamentar de Juazeiro no Rio de janeiro. Na capital federal, orquestrou-se uma “assembleia legislativa” dissidente, que, por seis deputados, elegeu Floro Bartolomeu, em sessão na terra de Padre Cícero, no dia 12 de dezembro de 1913, o novo presidente do Ceará.
Batalhão pró- Rabello (O Malho) |
E a partir daí dirigir-se
para Fortaleza com o objetivo de tomar à força o Palácio da Luz, sede do
governo. Acusado ainda de matar jagunços e bandidos que operavam para os coronéis
do Centro-Sul e do Cariri, Franco Rabello teria pela frente um conjunto desfavorável,
uma tropa com cerca de 400 pessoas, incluindo criminosos em busca de vingança,
que tomava e amedrontava cidades a caminho da sua cabeça: Crato, Barbalha,
Quixeramobim, Quixadá, Baturité, depondo os dirigentes pró-Rabello. No dia 14
de março de 1914, o presidente Hermes da Fonseca decretou a queda de Franco
Rabello, assumindo o general Setembrino de Carvalho. No outro dia o povo
acompanhou o político deposto até o cais na Praia do Peixe (Iracema). Rabello
partia para o Rio de Janeiro, porém sem os gritos de “babaquara” como ouviu
Accioly.
O Padim lava as mãos
Floro e Pe. Cícero |
O Coronel assume o golpe
Batalhão de Floro Bartolomeu (Foto F. Fernandes Nascimento) |
Por conseguinte,
Floro Bartolomeu também negou apoios de Padre Cícero e externo para a rebelião,
ou seja, assumia a coordenação para salvar seus companheiros coronéis, que não
eram apreciados por Franco Rabello. Mas incorria à desculpa de que os mesmo não contribuíram financeiramente com os custos. O religioso, chantageado,
temendo o retorno da questão religiosa (o tal milagre da hóstia sagrada),
convenceu-se de que, para o progresso de Juazeiro do Norte (o que realmente
aconteceu), melhor seria, como caudilho, ficar com os ideais de Floro
Bartolomeu. Com ele encontraria a sua tranquilidade.
Juazeiro cresce com o político Padre Cícero
As consequências do
assalto das forças caririenses à capital foram danosas, tornando a política local
mais centralizadora. O Dr. Joaquim Alves, natural de Jardim CE, fundador da
Sociedade Cearense de Geografia e História, sócio do Instituto do Ceará, assim
analisou Juazeiro após a queda de Franco Rabello: “A luta armada em que se
empenharam os partidos em 1914 terminou com a vitoria dos homens de Juazeiro,
que passaram, desde então, a influir, poderosamente, na máquina política do Estado,
sendo Pe. Cícero eleito vice-presidente ao período imediato à revolução. O Dr.
Floro Bartolomeu da Costa passou a dirigir a política regional em todos os casos
locais”. Contudo, o historiador, ainda que em contradição à aliança com os coronéis
e seus jagunços, fez a defesa dos envolvidos na sedição: “Não podia o Padre
Cícero responder pessoalmente por atitudes de inimigos rancorosos como são os
grupos que se destroem nos sertões. Não podia o Dr. Floro responder pela
presença de chefes de grupos políticos armados em Juazeiro. Eram fatos que
caracterizavam uma época”.
Ceará dos Coronéis
Estavam no poder
novamente as forças do cabresto, os coronéis em cuja casa grande pelo menos um
cavalo era de um jagunço. E aos que lhes pediam comida que procurassem o padre
que idolatravam. Um grande trabalho, porem, teriam pela frente: uma grade seca
provocaria uma nova desgraça no Ceará. E mais uma rota humana rumo a Fortaleza.
Não de corja, mas de vitimas das ganâncias e maldades dos políticos.
Ao lado do seu genro e futuro senador Francisco Sá, temos Accioly deixando o Ceará após a renúncia. |
Fontes: Jornal O Povo (CE) "A Sedição de Juazeiro - Guerra Civil no Ceará" (Marcelo Ayres Camurça Lima), “Juazeiro, Cidade Mística” (Joaquim Alves), “Os Partidos Políticos do Ceará” (Abelardo F. Montenegro) e Acervo Lucas.
O governador Franco Rabello chega à Assembléia Legislativa (O Malho) |
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