Antônio Martins - O Poeta Libertador
A Peste
Antônio Martins Jr |
Rumo a Trairi
De
Fortaleza, Antônio Dias Martins, o pai, capitão da Guarda Nacional, fez as malas com a esposa,
Francisca Dias Martins (outrora Xavier de Albuquerque), e o filho, Júnior, nascido em 16 de junho de 1852, retornando à sua bucólica vila, Trairi, no litoral norte, onde os Martins se estabeleceram por volta de 1845 com relativo poder social. Logo após a chegada, em 1859, nasceu Amélia Dias Martins, que, jovem, conheceu Antônio Gomes Bezerra, cansando-se e indo morar em Pentecoste, onde o marido foi líder político durante a Oligarquia Accioly. Numa terra pouco habitada, com vasta vegetação e rio de águas límpidas correndo
para o mar próximo, tinha tudo para um convívio sadio junto à natureza, quando
Dona Francisca, anos depois, faleceu acometida de outra moléstia, provavelmente
pela varíola, que matou milhares de cearenses.
Caixeiro em Fortaleza
Após o
nascimento dos irmãos, Amélia, Augusto, Maria Augusta, Álvaro (o poeta) e Francisco (médico e seu colega
abolicionista), fruto da relação do pai com Thereza Dias Martins, Antônio Dias
Martins Júnior, o filho mais velho, educado pelo renomado professor da cidade, e futuro intendente, José Joaquim de Gouveia, retornou para Fortaleza, onde iniciou sua jornada de
trabalho, adolescente, como caixeiro (ajudante), nas livrarias, adquirindo o
lampejo para a pena, escrita. Pouco depois, com o prestígio do pai, conseguiu
emprego na Alfândega. Embora numa repartição ligada aos interesses de D. Pedro
II, Antônio convivia entre simpatizantes de dois lados, pró e contra a
monarquia. Manteve-se mais tempo defensor dos conservadores por conveniências familiares, embora tenha entrado na política por influência dos Pompeu, liberais sem extremismo.
O Jornalista "De L'Isle"
Jornal Constituição, 23/07/1883. Antônio Martins como "De L'Isle" |
O Poeta
Com Antônio Bezerra de Menezes e Justiniano de Serpa publicou “As três Liras”, livro de versos e com finalidade abolicionista. A última parte delas é de sua autoria e denomina-se “Harpejos”, a tríade mais apaixonante do poeta, ele que mais esteve na intimidade das filhas de Zeus. Isso fez de Antônio Martins um grande poeta e fino cronista. Usando o criptônimo de Pery, levou para os jornais as mais delicadas crônicas. Com os seus fragmentos literários, e parceria com João Lopes, conquistou o gosto dos leitores, ao ponto de torná-lo hábito ou vício, tais a sua riqueza verbal e a suavidade do seu estilo. Das suas incontáveis inspirações transpôs para Harpejos: “Die Irae”, “Surge et Ambula”, “Estátua de Carne”, “Versos”, ao rolar do trem para Acarape, “Versos” à libertação da vila de São Francisco, “O Monge de Granito”, “Visita de Família” e “Contrastes” (5 Sonetos).
Abolicionista
Vultos da "Libertadora" (1880) |
Fervilhavam os movimentos abolicionistas no
Brasil após a “Ventre Livre”, principalmente no Rio Grande do Sul, Amazonas e
no Ceará, onde, no dia 28/9/1879, no final da devastadora seca de três anos, surgiu
a “Perseverança e Povir”. Idealizada por Antônio Martins, responsável pelos
estatutos, a organização era formada principalmente por seguimentos da classe
média, pessoas de leitura, com conhecimento de movimentos idênticos ocorridos
na Europa. Diante das manifestações via “Constituição”, as adesões aumentaram,
de modo que, em 8/12/1880 nasceu a “Sociedade Cearense Libertadora”, tendo como um
dos seus líderes Antônio Martins, ao lado de José Teles Marrocos, Manuel Albano Filho, Justiniano de Serpa (futuro Presidente do Ceará,
ou seja, governador até sua morte, em 1923), Alfredo Salgado, Antônio Bezerra, Isaac Amaral, Pedro
Borges, Pedro Artur de Vasconcelos, José do Amaral (vice-presidente) e outros
como João Cordeiro, seu presidente apaixonado, que em seus inflamados discursos
exigia juramento pela luta contra o silêncio do imperador, ao clamor de “matar
ou morrer em prol da abolição”. Antônio Martins foi o principal redator do
célebre jornal da "Sociedade", “Libertador”, fundado no dia primeiro de janeiro
de 1881.
De contraditório, porém, o movimento partir de
conservadores, muitos comerciantes e escravagistas, por exemplo, e políticos
que se ligariam à Oligarquia Accioly (revezamento entre políticos comandados
pelo autoritário Nogueira Accioly), que assistiam à disparada negativa dos preços
dos escravos, sendo provável que, por trás do “heroísmo” de alguns, houvesse
interesses com fins ideológicos e demagógicos, com o advento do capitalismo
industrial. Os liberais, por outro lado, viam o movimento com desconfiança, não
aceitando a liberdade absoluta dos escravos. Mas, diante da repercussão positiva, como as manifestações populares, acabaram perdendo simpatizantes.
Redenção da Luz
Antônio Martins foi um dos
abolicionistas presentes no Acarape (Redenção), a primeira vila do País a abolir os
escravos. No dia primeiro de janeiro de 1883, o movimento herdou ao Ceará o
título de “Terra da Luz”. Em 2 de fevereiro do mesmo ano foi Dr. Rodolfo Teófilo
quem comandou a “Liberta Pacatuba”, justamente na terra da sua esposa,
Raimundinha. Entre os colegas da “Sociedade Cearense Libertadora”, destacou-se a líder feminista e abolicionista, a sobralense Maria Tomásia Figueira
Lima. Nesse dia, Antônio Martins se encontrava numa ação idêntica, em Itapagé, então Vila de São Francisco de Uruburetama, onde 112 negros foram libertados.
A caravana da liberdade vivia angariando fundos para seguir as estradas vicinais da época com destino à luz, tendo trinfado em 21 dos 58 municípios cearenses.
A caravana da liberdade vivia angariando fundos para seguir as estradas vicinais da época com destino à luz, tendo trinfado em 21 dos 58 municípios cearenses.
"Liberta Fortaleza" encontra-se no Palácio da Abolição. |
Porém,
as conquistas tiveram mais relevância no dia 24 de maio do mesmo ano, quando o
Paço Legislativo declarou livres os escravos em Fortaleza. O ato de magnitude histórica foi retratado por José Irineu Souza (1883), na bela gravura de
“Fortaleza Liberta” onde vemos algumas personalidades como Barão de Studart, José
Francisco Albano (futuro Barão de Aratanha), o mais rico comerciante da cidade,
e outros “abolicionistas” de posses, muitos ligados aos opositores liberais.
Liberdade na sua Terra - Trairi
Martins levou para sua terra a grandeza de sua
luta. Em 31 de dezembro de 1883, durante os festejos da padroeira, Nossa
Senhora do Livramento, deu-se a libertação dos 249 escravos de Trairi, num ato
marcado pela excepcionalidade na concorrida celebração religiosa, que mantém-se forte, e ao mesmo tempo revelando-se num
registro histórico para aquele povo litorâneo. No cartório, porém, lavrou-se em primeiro de janeiro do ano seguinte.
Somente,
enfim, no dia 25 de março de 1884, a abolição estendeu-se a toda a província.
Um dia histórico para o Ceará. O anúncio feito pelo presidente da província,
Sátiro Dias, aclamado sócio-benemérito da "Libertadora" fez eclodir uma festa popular na praça Castro Carreira (Estação) após todo o dia de festejos, iniciados no Paço da Assembleia, onde um coral de 14 senhoras cantou o "Hino da Redenção", cuja letra é de Antônio Martins, na presença do novo Bispo, Dom Joaquim, seguido de longos e inflamados discursos, como o do próprio Martins, um grande orador, e de Dona Maria Tomásia, presença marcante no processo libertador cearense.
O Amor ao Jornalismo e a Partida
Após a causa abolicionista, elogiado pelos
colegas, passou à redação do jornal “O Norte”, conseguindo com sua altivez na
comunicação popularidade e uma cadeira no posto de senador estadual. Partia
para a exclusividade jornalística e política. Assinando como "Pery", escreveu famosa crônica saudando a fundação, em, 28/06/1884, do Clube Iracema, do qual foi um dos fundadores, concorrente do Clube Cearense, num sobrado na rua Senador Pompeu com Guilherme Rocha. Deixou o cargo na Alfândega,
queixando-se de dores, ao qual seu irmão Álvaro o substituiu. Adoentado, usou de todos os
recursos para o tratamento na coluna vertebral, inclusive na Europa. Mas acabou
falecendo no dia 31 de março de 1895, aos 42 anos. O “Diário do Ceará”,
primeiro jornal da província, dedicou-lhe uma edição exclusiva no dia 30 de
abril seguinte. Deixou os filhos Paulo Dias Martins e Antônio Martins Neto, além da irmã Amélia.
Assim descreveu o seu colega Antônio Bezerra sobre o amigo:
" O intransigente soldado das ideias novas tem demais um coração magnânimo que o
torna ainda simpático por atos de generosidade, e apesar da modéstia em que se
esconde, faz parte da plêiade valente que se ilustra nas letras e não escolhe
meios para desbravar os tropeços que se antepõem à marcha triunfante dos
pioneiros do futuro.
Quando a pátria
reconhecida tiver de refletir aos posteros os feitos mais gloriosos dos seus
filhos pela estabilidade de sua legítima grandeza, seu nome avultará entre os
mais queridos e mais respeitáveis. Há muito tempo que me habituei a prezá-lo
como benemérito e como herói".
Algumas dos seus registros:
- “As três Lyras”, coleção de versos
abolicionistas publicados em volume com os de outros dois poetas. Antônio Bezerra
e Justiniano de Serpa.
- “Discurso pronunciado na sessão inaugural da “Sociedade Cearense Libertadora”, em 8 de dezembro de 1880, Typ. Econômica, Fortaleza.
- “O incêndio do Taboão”, poesia cuja venda reverteu em favor das vítimas dessa catástrofe ocorrida na Bahia.
- “Introdução à Ata da Sessão Magna que Celebrou a Associação Perseverança e Porvir em 20 de Maio de 1883 - pela Extinção do Elemento Servil no Brasil”. Fortaleza, Typ. Universal, Rua Formosa 23, Cunha, Ferro & Cia, 1890.
- “Discurso pronunciado na sessão inaugural da “Sociedade Cearense Libertadora”, em 8 de dezembro de 1880, Typ. Econômica, Fortaleza.
- “O incêndio do Taboão”, poesia cuja venda reverteu em favor das vítimas dessa catástrofe ocorrida na Bahia.
- “Introdução à Ata da Sessão Magna que Celebrou a Associação Perseverança e Porvir em 20 de Maio de 1883 - pela Extinção do Elemento Servil no Brasil”. Fortaleza, Typ. Universal, Rua Formosa 23, Cunha, Ferro & Cia, 1890.
Raimundo Girão, competente historiador do
Ceará sobre a realidade dos nossos escravos na época, segundo registro no seu
livro, “A Abolição no Ceará” (1956):
Livro de Raimundo Girão |
"Libertador" de 1 de janeiro de 1884 registra, como
sendo de 31.516, a população escrava do Ceará, assim distribuída pelos diversos
municípios: Fortaleza-Messejana, 1.273; Aracati-União (Jaguaruana), 1.159;
Granja-Palma (Coreaú), 1.240; Acaraú, 440; Aquiraz, 449; Acarape (Redenção),
115; Assaré. 512; Barbalha-Missão Velha, 711; Baturité, 789;
Canindé-Pentecoste, 516; Cascavel, 807; Crato, 835; Icó, 731; Ipu, 736;
Imperatriz (Itapipoca) 882; Jardim, 446; Jaguaribe - Cachoeira, 608; Limoeiro,
608; Lavras, 768; Maranguape-Soure (Caucaia), 847; Maria Pereira (Mombaça),
438; Milagres, 586; Morada Nova, 367; Pedra Branca, 157; Pacatuba, 298;
Pereiro. 465; Quixeramobim, 1924; Quixadá, 298; S. Francisco (Itapajé),
427; S. Bernardo (Russas), 1972; Santa Quitéria, 820; Santana do Acaraú, 941;
São Mateus, 499; Saboeiro-Brejo Seco (Brejo Santo) 1130; São João do Príncipe
(Tauá.); Arneirós, 1956; S. Benedito - Ibiapina, 135; Telha (Iguatu), 251;
Trairi, 249; Tamboril, 614; Viçosa, 323 e Várzea Alegre, 153.
Aceita o Barão de Studart que, no dia da libertação total, em 1884, havia na
Província 30.000 escravos, ao passo que Sousa Pinto, os estima em 31.754. Em
30.000 mais acertadamente calculava Rodolfo Teófilo, os existentes ao começar a
seca de 1877-79. Na verdade, os 31.913 do censo de 1872, em virtude dos fatores
apontados por Barros Pimentel, não podiam ser, no momento inicial da batalha
libertadora, senão aqueles por ele indicados. Daí por diante, os libertadores
fariam esse número cair a zerar.
Revista do Instituto do Ceará (Histórico,
Geográfico e Antropológico) – 1987:
PERSEVERANÇA E PORVIR:
Instalada
no dia 28 de setembro, em homenagem, expressamente declarada, ao oitavo
aniversário da Lei do Ventre Livre. A sessão efetuou-se na casa então nº 100 da
Rua Formosa (Desde 1909, Rua Barão do Rio Branco), presentes os "sócios
instaladores": José Correia do Amaral, José Teodorico de Castro, Joaquim
José de Oliveira Filho, Antônio Dias Martins Júnior, Antônio Cruz Saldanha,
José Barros da Silva, Francisco Florêncio de Araújo, Antônio Soares Teixeira
Júnior, Manuel Albano Filho e Alfredo Salgado.
Três destacados membros da causa abolicionista cearense. (Arquivo Fortaleza Nobre) |
Pelos
estatutos organizados por Martins Júnior e aprovados, com emendas, na reunião
de 19 de outubro, a sociedade manteria um fundo de emancipação, que ia sendo
alimentado com a contribuição espontânea dos associados e uma percentagem nos
ganhos obtidos em cada operação mercantil. A primeira diretoria de mandato
semestral foi eleita na mesma reunião: Presidente - José do Amaral (7 votos);
Vice-Presidente - José Teodorico (5 votos); Tesoureiro - Joaquim de Oliveira
Filho (7 votos); Secretário - Alfredo Salgado (8 votos); Diretores - Antônio
Cruz (7 votos) e Barros da Silva (5 votos). Já se achava ausente o sócio
Teixeira Júnior, de viagem para Lisboa, em tratamento de saúde.
Continuou
a interessante associação as suas reuniões em lugares diversos, ora na Rua
Amélia (hoje Senador Pompeu) nº 125, ora numa das salas do Hotel de L’Univers,
na citada Rua Formosa, ora na Rua Conde d'Eu, até que, de 11 de julho de 1880
em diante, passou a funcionar na sua sede do "Castelo da Rocha Negra",
dependência da casa de residência do presidente, José do Amaral,
"recentemente edificada", na mesma Rua Formosa, no quarteirão adiante
do prédio onde se instalara. A esse tempo já se havia retirado para Belém do
Pará o sócio Teixeira Júnior, pois, voltando da Europa, "não lhe fora
possível obter um emprego condigno". Em sessão de 27 de junho fizera ele a
declaração de sua retirada do Ceará e a sociedade, por seu presidente, explicou
terem sido improfícuos os trabalhos para a consecução do emprego, "em
vista da calamitosa crise comercial que tanto tem amesquinhado a nossa
praça".
A
Perseverança e Porvir promoveu e efetivou, em 28 de setembro, sessão
comemorativa do seu primeiro aniversário de fundação, com alforria de uma “escravinha”
de 10 anos de idade. Falaram Nabor Albion Chagas, presidente da sociedade
"Liberdade e Heroísmo", em vigoroso discurso; o Dr. Frederico Borges
e Francisco Dias Martins (irmão de Antônio), este recitando versos alusivos ao
ato. Firmam a ata da sessão muitos daqueles, cavalheiros e damas, que vão mais
tarde desenvolver brava ingerência nas desabusadas lutas da libertação. Além
dos 9 sócios, acham-se firmemente gravadas as assinaturas de Frederico Augusto
Borges, Francisco Carneiro Monteiro, João Lopes Ferreira Filho, José Antônio de
Castro e Silva, Gonçalo de Lagos Fernandes Bastos, Antônio Rodrigues da Silva
Siqueira, Adolfo Barroso, José Alves Ferreira, Francisco Dias Martins, José
Gomes Barbosa, Joaquim Carneiro da Costa Filho, Alfredo Borges, Bento Leite de
Albuquerque, Catão Pais da Cunha Mamede, Francisco R. Salgado, Nabor Alboin
Chagas, Joaquim José de Oliveira, Arnulfo Pamplona, Eugênio Marçal, Pedro
Augusto Borges, Vitoriano Augusto Borges, Amanho Olinda de Vasconcelos,
Luduvina Borges, Elvira Pinho, Júlia Amaral, Ana Joaquina do Rego, Maria
Teófilo Martins, Francisca Nunes da Cruz, Joana Peres de Farias, Francisca
Borges da Cunha Mamede, Maria Farias de Oliveira, Maria Teófilo Padilha, Maria
Teófilo Morais, Joana Girard de Barros, Maria dos Santos Castro, Raquel Amaral,
Teresa Adelaide Carneiro do Couto, Maria Cruz Saldanha e Adelaide Girard.
Itapajé,então Villa de São Francisco de Uruburetama. 1883 |
As atas
de 8 do aludido mês de outubro e de 1 de novembro seguinte são de iniciação, em
caráter magno, de dois novos irmãos — Raimundo Maciel e Luís Xavier da Silva e
Castro, os quais haviam anteriormente obtido a unanimidade da votação nas
esferas amarelas e prestaram o sacramental juramento do art. 11 dos estatutos:
"Juro perante Deus, a Lei e os sócios presentes guardar, com honra e
religião, os deveres de sócio da sociedade Perseverança e Porvir, para cujo
grêmio entrei livre e voluntariamente, tendo em vista os deveres e o progresso
comum social, como o meu próprio interesse". Maciel morava na vila de
Aracoiaba e por este motivo esteve dispensado da assiduidade estatutária.
É na
sessão de 28 de novembro que se acertam as providências para a "reunião de
8 de dezembro seguinte, dia aprazado para a inauguração da “Sociedade Cearense
Libertadora”, ficando combinado que todos os sócios tomariam parte ativa na
promoção da festa, prestando-se de comum acordo para os preparativos de salões
do Palacete d'Assembleia Provincial e mais outras precisões relativas ao dito
fim".
A “Perseverança
e Porvir” acendia o estopim do barril de pólvora que seria a “Libertadora”, nas
explosões de sua ação destemerosa e afoita, obstinada, exacerbada ao calor dos
entusiasmos, às vezes sem freio, que ardem feridas ou arrebentam Bastilhas, mas
constroem princípios de justiça e gloriosas diretivas de beleza cívica,
profundamente humanas e niveladoras.
Oliveira
Viana divide em três fases a evolução do grande pensamento da libertação
servil. A primeira, que se inicia em 1865 e culmina em 1871, com a lei Rio
Branco, estabelecendo a liberdade dos nascituros, de caráter tipicamente
moderado. A segunda, que começa com a aparição de Joaquim Nabuco no cenário
parlamentar, trazendo ideias francamente radicais, e vem encerrar-se em 1885
com o fracasso do conselheiro Dantas, não querendo senão, ainda moderadamente,
completar a lei de libertação dos nascituros com o seu projeto de libertação
dos morituros, ou seja, os escravos sexagenários. E finalmente uma terceira, a
da libertação imediata, que chega ao fim da campanha: "A ideia
abolicionista, atingindo o máximo de expansão, tem todas as características da
incoercibilidade, da irresistibilidade, da fatalidade", e "deixará a
abolição de ser uma questão de partidos para ser uma questão nacional".
A rapaziada da “Libertadora” vivia,
antecipadamente, a derradeira fase, quando na Corte o movimento ainda não
perdera o tom da emancipação lenta, toda respeitosa dos direitos dos senhores
de cativos. Só muito depois, como se verá, o radicalismo abolicionista adquiriu
o impulso decisivo, já o Ceará podendo oferecer à Nação o exemplo do seu 25 de
março.
"OS DOZE APÓSTOLOS DA SANTA CAUSA"
A
expressão é de um deles — Antônio Martins, no discurso pronunciado no ato de
fundação da Libertadora.
A iniciação de Raimundo Maciel e Luís Xavier
completara a dezena da mocidade idealista, sem faltar, sequer o menos-um
iscariótico, que a tanto as circunstâncias adversas obrigaram, empurrando um
deles para fora. Eram todos jovens. José Teodorico de Castro, o mais velho, com
36 anos. Dos outros mais idosos, José do Amaral e Joaquim de Oliveira Filho
contavam 32 anos. O mais moço, Manuel Albano Filho, 21.
Entre todos, o mais destacado era José Correia do Amaral. Nasceu em Fortaleza, no dia 23 de agosto de 1847, filho do português João Antônio do Amaral, de quem foi sócio na sua casa de comércio de ferragens, a primeira deste gênero, na Capital. A mãe, também lusa, Maria Correia de Melo, viera de Angra do Heroísmo, na Ilha Terceira, para o Ceará, em 1840, trazida pelos pais, o "patriarca da Ypioca" (sítio em Maranguape), Antônio José Correia, falecido aos 81 anos, considerado e respeitado, tal como sua mulher, D. Eugênia Rosa Bandeira. José do Amaral, de temperamento arrebatado e inquebrantável ânimo, impôs-se desde o começo à estima dos seus consócios da "Perseverança", a qual sempre presidiu, em sucessivas reeleições. Foi o elemento constante na direção da sociedade e soube conduzi-la com acerto e eficiência. Fez-lhe a sede em sua própria residência, batizada "Castelo da Rocha Negra", e deu-lhe tudo quanto estava em suas forças, no seu ardor pela campanha que o empolgava. Deu muito de si e muito de sua fazenda, gastando talvez mais do que podia, nela interessando diretamente a irmãos Arão e Isaac e as irmãs Eugênia, Júlia, Judite e Raquel, cujos nomes nunca serão esquecidos, como valiosas coadjutoras da memorável batalha redencionista.
Transmitia o seu entusiasmo à própria filhinha única, do seu primeiro casamento com Maria Júlia Teles de Menezes Alves, a menina Abigail, que veio a ser a esposa do des. José Moreira da Rocha, Presidente do Ceará no período de 1924-1928. Quando da criação da "Libertadora", José do Amaral passou a servi-la com ainda maior disposição, eleito 1º vice-presidente sem, contudo, deixar a presidência da sua querida "Perseverança". Define-o este conceito de Júlio César da Fonseca: — "Abnegado e intransigente, pode-se dizer sem errar, constituiu o seu expoente (da Libertadora) máximo. Jamais consentiu que a causa que abraçou fosse maculada, um só instante sequer, por qualquer estigma ignominioso. Era um todo inamolgável de renúncias batalhadoras. O seu pensamento, o seu conceito, o seu sistema, o seu programa, tudo nele era um conjunto homogêneo de forças. Não sabia o que era a hesitação, só sabia o que era a decisão. Era a ação e a ação, como se elas fossem audácias dantônicas”. Faleceu na capital cearense em 26 de junho de 1929, aos 82 anos, portanto.
Depois
de Amaral, o homem de maior atuação e prestígio na original agremiação é
Antônio Cruz Saldanha, nascido em Canindé, em 24 de abril de 1852, da
tradicional estirpe dos Barbosa Cordeiro. Associado ao irmão Francisco, montou
casa de negócios comerciais em Fortaleza e, como comerciante, largamente
desfrutou da mais destacada consideração. Na "Perseverança", a sua experiência da
vida mercantil era uma orientação para todos. Retidão de caráter e coragem, bom
senso e inteireza de atitudes foram os seus grandes traços, na vida privada e
na vida pública. Republicano convicto, nunca faltou ao seu posto nas pugnas da
implantação do novo sistema de governo no País. Político militante, nem uma vez
só desertou da linha avançada, na férrea oposição ao regime oligárquico
plantado, com raízes fundas, no Ceará, pelo comendador Nogueira Acióli. Nos
entreveros da abolição ninguém o superou no esforço e na abnegação,
prestando-lhe inestimáveis serviços. Dele, dentro da "Perseverança", é que partiu
o pensamento de fundar-se uma sociedade anti-escravocrata de maior amplitude —
que seria a "Libertadora". Faleceu na sua fazenda de criar, em Canindé, a 26 de
julho de 1908.
José
Teodorico de Castro viera do Aracati, onde nasceu em 8 de outubro de 1843,
filho de Raimundo Teodorico de Castro e Maria Malveira. Ocupou, sempre, cargos
na diretoria da "Perseverança", da qual foi solícito animador. Exercia funções
comerciais e acabou empregado na Casa Boris Fréres. Falecido em Parangaba no
dia 19 de março de 1901.
José
Barros da Silva, de quem não pudemos colher melhores notícias, muito concorreu
para a vitória da Abolição. Fez do seu estabelecimento, denominado "Bolsa
do Comércio", quartel animado das reuniões dos libertadores. Também nunca
deixou de figurar na direção da sociedade, salvo depois que se retirou
definitivamente para o Pará, em começos de 1882.
De
Francisco Florêncio de Araújo sabe-se que nasceu na serra da Meruoca, zona
norte do Estado, em 27 de outubro de 1855 e, vindo para Fortaleza, abriu casa
de comércio de tecidos na Praça do Ferreira, em local ocupado, em parte, pelo
antigo Abrigo Central. Depois liquidou o negócio e empregou-se na Companhia
Ferrocarril, da qual saiu para ingressar como auxiliar da Casa Boris, posto em
que faleceu no dia 6 de maio de 1918. Casara-se em 1879 com Maria da Cunha
Araújo. Era filho de Florêncio Lopes de Araújo e Maria Rita de Araújo.
Manuel
Albano Filho, o Manezinho na alcunha carinhosa, o benjamim da plêiade, viera de
Pacatuba, onde nasceu na tarde de 9 de maio de 1858, filho de Manuel Francisco
da Silva Albano e Maria Teófila Albano. O pai era um dos três irmãos Manuel
Francisco, José Francisco e Antônio Francisco, os dois primeiros dos quais se
estabeleceram na Capital com a loja "Libertadora", sob a firma Albano
& Irmão, uma das mais ilustres e importantes casas importadoras em todo o
Ceará. Marcado, como o irmão seu consócio, de forte inclinação filantrópica,
recebeu José o título de Barão de Aratanha (1887). Albano Filho exercia a gerência da
casa e, pela distinção de maneiras e simpatia pessoal, conquistou a
popularidade e a afeição dos que o conheciam. O seu idealismo teve campo fácil
nas façanhas libertárias, a começar pela "Perseverança e Porvir". "Foi um
dos mais valentes e dedicados companheiros d'armas na luta incruenta, porém
vigorosa e tenaz, da liberdade dos cativos". Faleceu aos 29 anos de idade,
na manhã de 8 de agosto de 1887, em Parangaba. "Tinha n’alma espartana as
virtudes de patriota e de cavalheiro antigo" — são palavras de Antônio
Martins, ao fazer-lhe o necrológio. "Ao lado dos nossos mais fortes, ele
tornou-se distinto e nunca, no seu entusiasmo juvenil, brilhou mais esplêndida
e cívica irradiação de sua alma do que nos gloriosos tempos em que foi nosso
camarada, nessa campanha de heroica abnegação, de que ainda hoje poucos
conhecem o valor patriótico. Ele era o mais moço nessa legião e, entretanto,
foi o primeiro a deixar-nos".
Sociedade Cearense Libertadora.- Antônio Martins sentado à nossa direita. Atrás dele Dragão do Mar |
A CEARENSE LIBERTADORA
Os
sócios da "Perseverança e Porvir" souberam engalanar o salão de honra da
Assembleia Legislativa para a magna solenidade de instalação da Cearense
Libertadora por eles projetada. Muitas flores, a beleza da mulher, a vibração
das almas, o suspense dos momentos augustos e fortemente espirituais.
Às 11
horas já se achava tudo pronto, a casa plena de gente e de corações em
ansiedade, na tensão nervosa das grandes expectativas. O dia 8 de dezembro de
1880 iria, inquestionavelmente, assinalar "uma data de ouro para o
calendário da ideia abolicionista". E, apesar das escusas, que
apresentaram os organizadores, sobre "as imperfeições que se deram na
sessão, faltas que se desculpam atendendo-se a nosso pequeno número de sócios e
à pouca prática nesses assuntos", nada se omitiu na espontaneidade da bela
e inspiradora tertúlia.
Não nos
foi possível encontrar o livro de atas e o das inscrições de sócios da
agremiação que naquela hora se fundava, mas os fatos se recompõem por miúdo em
nosso espírito através das palavras dirigidas no ofício do dia 13 seguinte,
pela diretoria da "Perseverança e Porvir", aos diretores provisórios da sociedade
recém-criada e, notadamente, pelo Relatório ou Sinopse Histórica do Secretário
Antônio Dias Martins a eles oferecida. Foram seus sucessores na tribuna os
talentosos estudantes Raimundo Brito e Francisco Dias Martins, lendo aquele um
ardente discurso e este uma mimosa poesia.
Jornal Libertador - da "Libertadora" |
O LIBERTADOR
Dificilmente
se alui a opinião pública sem a alavanca da imprensa e bem o compreenderam os
da “Libertadora”. Trataram de fazer o seu jornal e o lançaram corajosamente no
dia 1º de janeiro, menos de um mês decorrido da fundação da sociedade:
"Por entre as brumas misteriosas da eternidade, o tempo fez sua evolução,
e a terra nas expansões do seu júbilo saúda o Novo Ano. Aos primeiros albores
de sua aurora celeste também surge na imprensa cearense um novo órgão de
publicidade. Romeiro da esfera terrestre, cumprimenta o mensageiro celeste e,
como ele, tem seu círculo a percorrer e sua missão a cumprir. Traça-lhes sua
posição o programa que tem representado o jornalismo brasileiro. Nas suas lutas
se debateram todos os interesses: a política e o comércio, as ciências e as
artes, a indústria e a lavoura continuam a ter seus paladinos. Apenas foi esquecido
quem tinha mais direito à solicitude do coração humano — o proscrito! Conviva
infeliz, sentou-se ao banquete da vida para sofrer e morrer. A fera indomável
da cobiça humana fez dele a sua vítima. Escravizou-o, vendeu-o, torturou-o e
matou-o. Um milhão e quinhentos mil desses infelizes, crismados com o nome de
cativos, ainda hoje não respiram livremente na pátria livre. 1822 negou-lhe o
batismo da liberdade! Mais tarde mistificou-se, em seu detrimento, a lei de 7
de novembro de 1831 e prosseguiu terrorosa a mesma opressão. A consciência
pública revoltou-se e a liberdade reclamou justiça. Entretanto, a lei de 28 de
setembro de 1871 aludia à questão, mas não solvia a dificuldade. Com o país que
se levanta em prol da mais santa das causas, vem hoje o “Libertador”
inscrever-se na liça de seus combatentes". São estas as primeiras palavras
da sua apresentação.
De
publicação quinzenal, este jornal é destinado à propaganda e interesses
abolicionistas. Órgão da "Sociedade Cearense Libertadora", ele aceita qualquer publicação
concebida nos termos do seu programa. Cada número avulso, 40 réis. Impresso na
Tipografia Brasileira até o nº 6, passando à Tipografia Cearense, mesmo local,
rua Formosa, 19. Impressor: Joaquim Lopes Verçosa. Formato: 21,5 x 30 cm., 8
páginas. Secções: Libertador, Gazetilha, Expediente, Folhetim, Literatura e
Página do Povo.
Redatores: Antônio Martins, Antônio Bezerra de
Menezes e José Teles Marrocos. Colaboradores, entre outros: Frederico Borges,
Justiniano de Serpa, Martinho Rodrigues, Almino Álvares Afonso, Abel Garcia e
João Lopes.
Manteve a sua publicação regular até o número
18, de 26 de agosto. Mais um número, em 28 de setembro, comemorativo da Lei do
Ventre Livre e da fundação da “Perseverança e Porvir”; e outro, nº 20, em 8 de
dezembro, primeiro aniversário da “Cearense Libertadora”, nascida assim sob os
auspícios da Imaculada Virgem, "mãe do louro sonhador da Galiléia”.
Esta
explicação inicial: "Não tem podido sair regularmente, como pretendíamos,
o nosso órgão — o “Libertador”, em consequência da afluência de serviço na
tipografia onde se imprime. Na quadra anormal que atravessamos, em que só se
respira o ar mefítico da política, atarefadas que se acham as outras oficinas,
cada qual mais empenhada em encarecer os bons ofícios de seus candidatos à
apresentação nacional. À vista disto tratamos da aquisição de um prelo para a
publicação diária do “Libertador”, que se ocupará da propaganda abolicionista,
dos interesses do comércio, indústria e agricultura etc. Não se intrometerá com
a política, essa asfixia da dignidade da nação, porque só curará de bem servir
o país. Montada convenientemente a empresa, como esperamos, não terão mais os
nossos assinantes razão de queixa pela irregularidade da publicação e desde já
comprometemo-nos manter ilesa a integridade do nosso programa. Mais alguns dias
e estaremos em campo ao lado dos grandes batalhadores, pugnando pelos
interesses de todos. Havemos de cumprir a nossa palavra"
E após outras considerações, termina: —
"É esta a nossa bandeira. Depois de longos meses de ausência retemperamos
n'adversidade e na luta a nossa coragem para hasteá-la bem alto. Mas
cumpriremos a nossa missão? E o que nos impedirá? Se o Libertador volta à
imprensa, é porque tem todos os meios de independência na sua empresa tipográfica,
na qual está sintetizada a “Sociedade Cearense Libertadora”. Seu órgão na
imprensa não é instrumento de especulação alguma, política ou mercantil. Não
visa lucros materiais e nem ambiciona o poder. Empenha-se, sim, com todas as
suas forças, por todos os melhoramentos da sociedade e bem-estar do país que
agoniza à míngua de patriotismo. Ajude-nos a Providência e seja conosco o
civismo cearense".
Jornal Libertador, 24 de maio de 1883 |
Noutra coluna explicava: "Fazendo sua
estreia jornalística no 1 de janeiro de 1881, continuou sua publicação
regularmente até 26 de agosto do mesmo ano. Mas o inquilino na casa de
mercenário, comprara muito caro o seu foro de cidadão na imprensa que também
editava o expediente do Governo. Contando assim 18 números apenas, despendido
tinha já de sobra quanto lhe bastava para a aquisição do melhor prelo manual.
Todos os sacrifícios que lhe deviam valer sua independência, não podiam sequer
ao menos garantir-lhe o direito de liberdade de imprensa. E depois os
acontecimentos de 30 de agosto, traçando a linha divisória entre a vontade
soberana do povo e o poder arbitrário do governo, acentuaram profundamente a
necessidade de conferir ao "Libertador" todos os elementos de vida própria. Ele
devia, pois, ter seu lar e sua tenda. A imprensa política é um oceano em tempestade.
Qualquer jornal, estranho a suas lutas, que aí desfraldar seu estandarte aos ventos da publicidade, será sempre o ludíbrio do fluxo e refluxo de alheios interesses. O “Libertador” suspendendo sua publicação, nada mais fez que cumprir o seu dever. Bem longa, porém, foi a noite que passou sobre o povo abolicionista que proscrito, como o israelita, afirmava, entretanto, sua vitalidade à opressão de Babilônia..." E, mais para o fim: "O jornal que ontem não tinha onde reclinar a cabeça, dispõe hoje da mais completa oficina tipográfica da província. Mais longa também é a base do seu programa: não exclui a ninguém dos seus comícios e nem olvida o direito do proscrito que inscreve no número dos seus comitentes. Ressurgindo, pois, à publicidade, o Libertador já tem todas as condições de vida própria e, para viver, não precisa matar ninguém. Cesse, pois, toda prevenção. Como o Nthchez, ele acende o calumet da paz e saúda fraternalmente todos os seus colegas da imprensa".
Qualquer jornal, estranho a suas lutas, que aí desfraldar seu estandarte aos ventos da publicidade, será sempre o ludíbrio do fluxo e refluxo de alheios interesses. O “Libertador” suspendendo sua publicação, nada mais fez que cumprir o seu dever. Bem longa, porém, foi a noite que passou sobre o povo abolicionista que proscrito, como o israelita, afirmava, entretanto, sua vitalidade à opressão de Babilônia..." E, mais para o fim: "O jornal que ontem não tinha onde reclinar a cabeça, dispõe hoje da mais completa oficina tipográfica da província. Mais longa também é a base do seu programa: não exclui a ninguém dos seus comícios e nem olvida o direito do proscrito que inscreve no número dos seus comitentes. Ressurgindo, pois, à publicidade, o Libertador já tem todas as condições de vida própria e, para viver, não precisa matar ninguém. Cesse, pois, toda prevenção. Como o Nthchez, ele acende o calumet da paz e saúda fraternalmente todos os seus colegas da imprensa".
Reaparecera,
com efeito o Libertador em formato grande de circulação diária e vespertina.
Assinatura: 10$000 por ano, na capital ou fora dela. Número do dia: 40 réis.
Número já arquivado: 200 réis.
A sua
tipografia, na rua Major Facundo nº 56, oferecia-se para preparar com prontidão
qualquer trabalho concernente à arte tipográfica, com magnífico prelo a vapor,
um prelo manual e uma máquina Magan, tudo material novo, sob a direção do mesmo
Joaquim Lopes Verçosa. O prelo Standard Double Crown, fabricado por Fréderik
Ullmer, viera de Londres pelo navio "Amazonense" e chegara ao Ceará
em 27 de agosto anterior. Foi o mestre Antônio da Rosa e Oliveira que o montou,
com toda a perfeição e sem querer pagamento, alegando que o fazia por
"Estar prestando um pequeníssimo serviço à redenção dos cativos". A
chegada do mesmo prelo foi anunciada pela Libertadora em boletim, que terminava
com estas quadras:
O MONGE DE GRANITO
Original de Antônio Martins
"Era da tarde ao fim, que o vi de perto,
Já das brumas da noite o vulto incerto ...
Um gigante de pé;
Depois, à luz do dia contemplei-o,
Fui mais perto, mais perto - o mesmo enleio
...
"Infinito galé!"
Como ele é majestoso! Viu passarem
Com os séculos gerações a se abismarem
Na tumba das idades; - sentinela dos mundos no
seu posto,
Tem das procelas rugas, pelo rosto sulcos das tempestades!
Fez-se monge . . . Preferiu à cela escura
O ambiente sagrado da natura,
Entre os muros azuis da cordilheira;
E aí, n'um paraíso aos céus aberto,
Constituiu-se - um marco no deserto
- Ancora da fé na crença derradeira.
Quem sabe a sua lenda?
Altos mistérios . . .
Dorme com as gerações nos cemitérios
A história deste herói! . . .
Sondar quem pode a alma gigantesca
Dessa estátua sem luz - múmia dantesca
Que o tempo não destrói.
O povo aponta-o respeitoso e altivo,
Como a estátua fatal d´um redivivo ...
Do dilúvio . . . talvez?
Da arca de Noé caíra a nado,
Té que um dia - aportou extenuado
Dos serros no convés!
Foragido dos mares, da esperança.
Tanto lutou que teve na bonança
O seu último alento;
Hirtos os membros, cansados, sem conforto,
Ascendeu ao Calvário antes do Horto - no
hérculeo passamento
Tem encelados os membros de granito,
Rolou lá das alméias do infinito dorso dos
destroços.
Jornais
Esteve
o jornal “República” sempre fiel aos princípios abolicionistas e após a vitória
continuou a circular como órgão do Centro Republicano. Com o advento da
República fundiu-se ao Estado do Ceará, órgão da União Republicana (partido da
coligação comendador Acióli — Barão de Aquiraz), para formarem A República, cujo
primeiro número é de 9 de abril de 1892. O Partido Federalista resultou da
contração do Centro e da União aludidos.
Durante o período de 1880-1884, começo e fim
da guerra anti-escravocrata, circulavam em Fortaleza, ora em paz, ora às turras
com o Libertador, mas simpatizantes declarados da causa, os jornais “A
Constituição”, “Pedro II”, e também, mas em terreno
contrário aos conservadores, com o “Cearense”.
“A Constituição”, depois "Constituição", da ala do Partido
Conservador chefiado pelo Barão de lbiapaba (Joaquim da Cunha Freire) e um
quase aliado, era dirigido por libertadores indúteis como Frederico Borges,
Justiniano de Serpa, Martinho Rodrigues, Almino Alvares Afonso. Tinha como
Redator-chefe Paulino Nogueira. Velha e tradicional folha diária, editava-se
desde 24 de setembro de 1863. Nele, escrevia na coluna Folhetim assinando como De L'Isle.
“Pedro II”, o mais antigo, vinha de 12 de
setembro de 1840 e nele escreviam, naquele tempo, Torres Portugal, Gustavo
Gurgulino de Sousa, Luís de Miranda, Gonçalo de Lagos e Paurilo Fernandes
Bastos. Era órgão dos conservadores partidários do Barão de Aquiraz (Gonçalo
Batista Vieira), alcunhados de miúdos.
A “Gazeta
do Norte”, do Partido Liberal, facção no Ceará chamada Pompeus, porque era
dirigida pelo Senador Tomás Pompeu e depois pelo seu genro Antônio Pinto
Nogueira Acióli, tinha como redatores Tomás Pompeu Filho, João Lopes, Júlio
César, João Brígido, Virgílio Brígido e João Câmara. Viera à publicidade em 8
de julho de 1880 e, com o triunfo republicano, transformou-se no “O Estado do
Ceará”, a partir de 21 de julho de 1890. Colunista, Antônio Martins conseguiu, a partir, do "Norte", o posto de senador da República.
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