José Levi - Voz do Povão na Praça do Ferreira
Zé Levi em 1945 Correio do Ceará |
“Trajava casimira e o seu jaquetão enfeitava-se com uma infalível rosa na lapela. Grossa corrente de ouro ligada ao cinto sustentava o relógio, colocado no bolsinho da frente da calça. Chapéu de massa de copa dobrada e guarda-chuva”. (Correio do Ceará)
José Levi não era um intelectual, mas estava, desde 1911,
nas turmas de discussões políticas com Quintino Cunha e Lindolfo Barbosa Lima, por
exemplo, pessoas cultas, letradas e de puder da oratória, a qual o outro ouvia
e tentava se associar. Crítico dos governos, notadamente de Nogueira Accioly,
aproveitava as concentrações para discursar, de preferência do tradicional
coreto, com o dedo em punho. Falava, misturava “coisa com coisa”, e não era aplaudido
como os demais, mas alvo de deboches, reações que não o intimidavam.
Estudava, lia e, com sua inseparável câmera, máquina símbolo
da modernidade, e da Belle Époche, fotografava a sujeita das ruas, a calamidade
sanitária, os causos de sua época, por certo se achando um membro da imprensa,
objeto de respeito e de conhecimento. Mas contrariando seu lado radical, e
talvez correto e sensato nos momentos adequados, apoiou chefes locais marcados por escândalos e
conchavos, como os governadores Moreira da Rocha (o Moreirinha) e Matos
Peixoto, famoso advogado, que foi seu professor e que saiu do poder para a
prisão.
Mais adiante no tempo, Raimundo Girão, jovem prefeito que
criou a Coluna da Hora, grande orador e inteligente, também chegado à prosa e à
movimentação política, o considerava uma pessoa vulgar, com discursos “tolos e
cheios de asneiras”. Mesmo assim José Levi o estimava como a muitos que lhe debochavam. Continuou as suas cenas, e foi além, fundando para si o Partido Pessoal, a agremiação de suas
ideias eivadas de provocações aos partidos políticos.
Naquela década de 1930, conturbada, com os getulistas no
poder via golpe e Menezes Pimentel interventor federal do Ceará, nosso
incansável lutador, que pleiteava assento parlamentar pelo voto, retirou-se
para não ser preso. Recluso em Pacatuba por dois anos, retornou quando teve
certeza de que reinava a paz, segundo o próprio, chamado pelas autoridades
“graças ao meu esforço e competência”.
.
1937. Almoço para os nazistas no Clube dos Diários. Foto: Aba Film. |
Em seis de janeiro de 1937 aportou em Fortaleza um navio nazista, recebido com poupas por elementos da sociedade local, principalmente pelos comerciantes. Crítico do integralismo, Zé Levi protestou com veemência, ameaçando processar os defensores do nazismo na PMF, afinal, segundo ele, era perseguido por ter nome judaico. Discursou do pedestal da Coluna da Hora: “Condenei veementemente aquilo, pois precisava chamar a atenção dos cearenses para um fato que talvez viesse o advento do plinismo* que se desejava implantar no Ceará”.
*Corrente ligada a Plínio Salgado, fundador da Ação
Integralista Brasileira.
Navio-escola de guerra Schlesien, construído em 1906, possuía 127
metros de comprimento e 22 metros de largura; transportava 13.200 toneladas,
contando com quatro canhões. Além do comandante e demais marinheiros, era auxiliado por 27 funcionários e um “padre protestante”. Sua presença no Brasil, pelo Rio
de Janeiro, Salvador e Fortaleza, finha como objetivo, segundo os convidados, “estreitar as relações” entre os dois
países.
Recebeu
homenagens do Instituto Teuto Brasileiro de Alta Cultura, filial do Ceará, na
Casa Juvenal Galeno. Sua diretoria era formada por Daniel A. Lopes
(presidente), Fernandes Vianna (secretário), Lauro Chaves (tesoureiro), além de
Lauro Nogueira, César de Moraes Fontenelle, Abner Amaral e Ubirajara Coelho de
Negreiros, quando se ouviu o hino alemão durante sessão artística que contou com mulheres pianistas tocando músicas alemãs. O famoso Praia Clube, da Praia
de Iracema, publicou nos jornais convite para o público assistir competições,
incluindo corrida de jangadas em saudação aos visitantes nazistas. Entre as
várias homenagens, um almoço no Palace Hotel ofertado pelo Rotary de Fortaleza,
destacando-se representantes do comércio local, como Inácio Parente e Pedro
Philomeno e João Menescal Villar. Discursaram o ex-prefeito Raimundo Girão (o
historiador), Oswaldo Studart (representante local da Ford e político), Clóvis
Matos (presidente da Associação Comercial do Ceara´), que pediu salva de palmas
à bandeira alemã; e o comandante do navio, Von Seebach, com um tradutor ao
lado. Não faltaram ainda outros almoços e jantares, inclusive no Clube dos Diários, instalado no belo Palacete Guarany.
1937 - Bandeira Suástica no Ceará. Foto: Aba Film |
Zé Levi se enquadra dentro do padrão brasileiro da época, em busca de um país democrático e ansioso por uma renovação política. Sua visão e análise sobre o integralismo e o nazismo se formaram de imediato, sem a influência dos principais canais de informações de então: a imprensa e a Igreja Católica. Estava ciente do que poderia vir, e assim se confirmou durante a II Guerra. Certamente deve ter feito seus maiores discursos, quando seus críticos não tiveram alternativas senão a desculpa por apoios aos regimes autoritários de direita.
Ao lado do jornalista Eduardo Brígido Correio do Ceará, 1945. |
Fonte: Correio do Ceará. 1945
Comentários
Postar um comentário