Escola Doméstica de Fortaleza, o Destino das Senhorinhas. Do Templo do Capitalismo para o Lar.
A Escola Doméstica de Fortaleza foi fundada em 1936, pouco mais de um ano após o falecimento do proprietário do imóvel no qual funcionaria, Plácido de Carvalho, uma vez que sua consorte optou por residir no seu Excelsior Hotel. Instrução particular voltada para mulheres de famílias de posses, recebeu do governador Menezes Pimentel uma subvenção para auxiliar no aluguel do prédio e de Perboyre e Silva, Diretor de Instrução (Secretário de Educação) material escolar de apoio, tinha como objetivo, dentro de um modelo social patriarcal, a preparação para um sólido casamento e vida para o lar.
Sua inauguração, porém, ocorreu em 12 de junho de 1937, num evento social que contou com a presença de autoridades. O grupo Severiano Ribeiro produziu um vídeo devidamente rodado em suas salas, o mesmo da parte de João Dummar, com propaganda na emissora de rádio PRE9. Devido à localização "afastada" da sede, as matriculas foram feitas na rua Barão do Rio Branco, 572, ponto da secretaria, e na Praça José de Alencar, 592 (Rua 24 de Maio),onde residia o vice-diretor.
Nos moldes da escola homônima de Natal RN,
onde concluiu estudos a diretora Maria Odete O’Grady, contava com forte
infraestrutura profissional e física. Com cursos longos, a partir de cinco meses
de duração, e rigorosa instrução técnica, visando uma “educação moderna” de
cultura feminina, na época denominada de “educação doméstica”. Diversificada,
abrangia conhecimentos sobre costura, desenho, canto, música e piano;
jardinagem, corte e confecções; ginástica,
criação, leitaria, cultura física, puericultura, lavanderia, medicina
prática e obviamente cozinha prática e teórica.
Palacete do Plácido 1937. Foto J. O.
Após o banho de sol, e a prática esportiva que incluía voleibol, tênis e basquetebol, cada aluna, devidamente fardada, possuia suas tarefas durante as aulas, revezando-se, por exemplo, na ornamentação das salas, no asseio do mobiliário, no arranjo das mesas e na maneira de receber visitas. O grande templo, com os seus andares, quadras e jardins, favorecia essa distribuição. Por isso, para a direção, eram “cultivadas por todo o corpo discente o sentimento estético e o embelezamento do lar, quer nos dias ordinários, quer nos de festas e recepções”.
Aula de cozinha. Palacete do Plácido (Correio do Ceará) |
Conforme a diretora, “toda mulher, naturalmente, se preocupa com a organização do seu lar no futuro. E, como se sabe, nos colégios existentes em Fortaleza, tem sido muito esquecido esse lado, esse aspecto da educação: a aprendizagem doméstica. Com uma escola para preencher essa lacuna, podemos dizer com orgulho: as jovens cearenses já podem realizar o seu sonho; já podem ser completas donas de casa”.
Diretora Odete e professoras na varanda do Palacete do Plácido (Correio do Ceará) |
Diretoria:
Maria Odete O’Grady: diretora técnica. Potiguar de nascimento, loira dos olhos azuis, sua família, descendente de irlandeses, chegou no Ceará onde seu pai era servidor da Fazenda e seu tio Omar dono de famosa construtora. Com o seu irmão, diretor de escola em Mossoró, Padre Jorge O'Grady, desenvolveu os dotes para a educação.
Raymundo
Arruda Filho: diretor pedagógico. Zulita
Arruda: vice-diretora. Marieta Cavalcanti e Regina
Ramos: secretárias. Maria
Efigênia Cavalcanti: tesoureira. Professores:Branca
Morais Correia: cozinha. Maria
Alice Amaral: costura. Monsenhor
Octavio de Castro: religião. Adele
Mendonça: ginástica.Cândida
de Luna Freire: música. Zezita
Gurgel Correia: jardinagem
Adicionar legenda |
Padrinho da Escola Doméstica, o poeta Antonio
Salles recitou o poema abaixo (de cunho integralista, conservador e machista,
como predominava a política na época) no dia da sua inauguração. Lembrando que durante
o seu velório, em 14 de novembro de
1940, as alunas, ex-alunas, “afilhadas”, uniformizadas de branco e de
boinas, prestaram-lhe homenagens:
Nos anos 1970, abandonado. Foto Cláudio Pereira
“Paladinas do lar, enfim triunfastes! Com vossas mãos ativas e piedosas pasmastes
as ideias generosas,
que
em vosso nobre espírito gerastes. As pompas vãs do mundo desdenhando, da Pátria ouvindo o maternal chamado, quisestes bem dervi-la, alevantando este Templo à Família consagrado. As almas jovens, que, desarvoradas,
sulcariam sem rumo o mar da vida. por vosso ensinamento orientadas, vão em seguro porto achar guarida. Deus, a Pátria, a Família, eis a trindade que aqui com tanto zelo se cultua; em voz acha esta ensiosa mocidade quem a guie, quem a mae, quem a instrua. E vós, meninas, damas do futuro, um dia haveis de ter de um lar o mando, e eu vejo em vosso olhar sereno e puro uma esperança imensa alvorejando. Levarei nos espíritos sagrados semente do bem, que em frutos mil serão por vastas terras espalhados, para
a glória de Deus e do Brasil.”
Mal terminadas as formaturas das primeiras turmas, a Escola Doméstica de Fortaleza fechou as portas, abrindo-se, na Av. Visconde de Cahuype (Cauípe, ou, atualizado, Av. da Universidade), 2995, antiga residênia da família João Gentil, cujo imóvel foi demolido, a Escola Doméstica São Rafael, hoje na Av. do Imperador.
Em 1974, o palacete da Aldeota
veio abaixo após sua venda pela herdeira da família de Dona Pierina Rossi, viúva
de Plácido de Carvalho. Um verdadeiro atentado ao patrimônio da cidade.
(Acervo Lucas)
Pesquisa: Academia Cearense de Letras e Jornal Correio do Ceará
Correio do Ceará, 1974 |
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